Nascido e criado na zona rural do município de Pratinha, Minas Gerais, Vladmir sempre foi considerado um dos caras mais sangue bom do clã da cidade. Embora sua aparência robusta e deveras monstruosa pudesse indicar o contrário, Vladinho era tranquilão, só queria saber de vagar pela noite com os parceiros e se lambuzar com as polpas suculentas de mangas e bananas direto do pé, distante dos hábitos de qualquer criatura das trevas.
Não foi à toa que todo mundo estranhou quando o comportamento de Vladinho começou a mudar. Ele, que antes adorava dar um rolê de galera para encontrar os raros (porém deliciosos e aveludados) figos da região, não queria mais saber da companhia dos amigos e estava sempre de cara fechada, mostrando os dentes afiados para qualquer um que chegasse perto. Familiares tentaram intervir, todas investidas em vão. Nas madrugadas em que o bando saía em busca de frutos maduros, Vlad desviava a rota para ficar sozinho e era impossível descobrir seu paradeiro: ele não queria conversar com ninguém.
Determinados a desvendar o que diabos estava acontecendo – o que pode ter acontecido para aquele doce de menino se transformar assim, da noite pro dia –, amigos próximos esperaram Vladinho sair em um de seus passeios noturnos para invadir a caverna onde ele havia decidido morar sozinho. Quando entraram nos aposentos de Vlad, o bando entrou em choque total. O morceguinho fofo que todos conheciam jamais moraria ali: paredes pixadas de sangue, velas vermelhas acesas, garrafas vazias de suco de groselha espalhadas por toda parte, pôsteres do Bela Lugosi, a filmografia completa de Zé do Caixão, fotos autografadas do Michel Temer, a edição especial de capa amarela de Drácula de Bram Stoker. Vladinho definitivamente havia conhecido o goticismo.
Apesar do espanto, não havia nada que os morcegos de Pratinha pudessem fazer – que mal tem se identificar com um estilo um pouco mais sombrio que o convencional? A preocupação do bando era muito mais com a fama que Vlad podia estar levando para aquelas redondezas do que com o próprio morcego, que já era um adulto perfeitamente capaz de lidar com as consequências de suas escolhas. Mas elas poderiam comprometer todo o trabalho de relações públicas feito por pesquisadores nos últimos tempos. Foram séculos de pesquisa para que a ciência convencesse os humanos que os morcegos são polinizadores incríveis, e não seres trevosos, principalmente eles, morcegos-da-fruta.
Houve uma tentativa de seguir convivendo com Vladinho, que a essa altura só atendia pelo nome de Vladão, o Grande, mas quando espalhou-se o boato de que ele estava frequentando fóruns online em que morcegos herbívoros da Letônia ensinavam como abandonar a dieta vegana, a população de Pratinha se revoltou. Vlad foi expulso da comunidade depois de ser flagrado passando mal após drenar todo o sangue de três pobres galinhas de um viveiro nas redondezas. Apesar das intenções, Vladmir nunca tornou-se um vampiro, mas sim uma vergonha para os Artibeus lituratus da região.
Depois da surpresa de ler que era Vladinho, e não Viadinho no título, estou encantado por mais uma história sua. Ri alto com "fotos autografadas do Michel Temer".
Vladinho é estranho igual eu!